segunda-feira, 22 de março de 2010

Fala comigo... doce como a chuva


(...) Começa a chover. (...)


- Você voltou quando eu tinha saído para te procurar(...)
- Não podia telefonar(...)
- A única coisa que botei na boca desde que saiu foi café instantâneo, até que acabou, e água.(...)
- Fala comigo como a chuva e eu ficarei deitado aqui e ouvirei, eu ficarei...
- Eu quero ir embora(...) Sozinha,... me registrarei sob um nome falso num pequeno hotel da costa...
- Que nome?
- Anna - Jones...A arrumadeira será uma velhinha...que sempre me falará do neto.Eu sentarei em uma cadeira, enquanto ela fala do neto e arruma a cama. O quarto estará na penumbra, fresco e cheio do murmurio da...

- Chuva?

- Sim, chuva. Eu receberei um cheque...A velhinha trará livros e minha roupa lavada. Eu nunca serei forte, mas depois de um tempo terei energia suficiente para caminhar na calçada ,passear na praia...haverá uma estação de chuva
chuva...chuva...chuva...
Não me importarei de ficar ouvindo apenas a chuva...Não terei conciência da passagem do tempo...De vez em quando irei ao cinema...Lerei livros e os diários de escritores mortos. Essa minha amizade com poetas mortos será doce e refrescante, porque não terei que responder suas perguntas. Dormirei com o livro ainda entre os dedos e
choverá...
Acordarei e ouvirei a chuva, e voltarei a dormir.
Uma estação de chuva, chuva, chuva...
Então um dia, quando tiver fechado um livro ou voltado sozinha do cinema - Olharei no espelho e verei que meu cabelo ficou branco. Passarei a mão sobre meu corpo e sentirei o quanto fiquei leve e magra.
Oh, como estarei magra.Quase transparente. Quase irreal. Então saberei, de modo vago, que estava morando nesse quarto de hotel, sem nenhuma relação social, responsabilidade, ansiedades ou perturbações de qualquer tipo - por quase meio século. Nem sequer me lembrarei dos nomes das pessoas que conhecia antes, nem da sensação de ser alguém esperando por alguém que - talvéz não venha...Então saberei...que chegou o momento mais uma vez, de caminhar sozinha, com o vento forte batendo em mim, o vento limpo e branco que vem do princípio do mundo, ainda mais além do que isto, vem do princípio do espaço, ainda mais além de qualquer coisa que haja além do princípio do espaço...- Então sairei e andarei sozinha...e serei empurrada pelo vento e ficarei pequenina, pequenina.
- Amorzinho, vamos para a cama.
- Pequena, pequena, pequena, e mais pequenina e pequenina! - Até que finalmente não teria mais corpo e o vento viesse me tomar em seus braços brancos e refrescantes para sempre, e me levasse embora!
- Vamos para a cama!
- Quero ir embora. Quero ir embora(...)
- A luz pisca e ouve-se o vento frio...


- Vem para a cama. Vem para a cama, meu bem...




*Inspirado no texto de Tennese Willians

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